segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

O VELHO SÁBIO


O PAPEL DO MENTOR NA JORNADO DO HERÓI

O velho sábio, o mentor ou o ancião é uma figura fundamental no mito do herói, visto que, sem a figura do velho sábio, o herói nunca poderá se formar, a criança nunca se tornará um adulto. O mito do herói pode ser interpretado como um ritual de passagem, isto é, uma de suas facetas pode ser lida basicamente como uma história de como uma criança se torna um adulto, porém, não se deve identificar a figura do velho sábio com a figura do pai, ou mesmo estabelecer uma escala de valor entre essas figuras como sendo a primeira uma mera substituição da segunda. O pai nunca poderia vir a cumprir a função do ancião, o único parente que está apto para isso é o tio (pois o avô pode, este sim, acabar sendo facilmente uma substituição da figura do pai). O pai tem suas próprias funções no mito heróico (e claro, na vida), funções que o velho sábio não poderia desempenhar e vice-versa. Um herói órfão poderá, de início, ver o velho sábio como o pai que o destino lhe roubou, mas, em um momento decisivo de sua jornada, ele deve perceber que isso não é verdade. O velho sábio não é uma substituição do pai, um pai postiço, a stepfather, ele é, juntamente com o pai e a mãe, um elemento fundamental da tríade basilar que formará o herói. Não fosse assim, as histórias não insistiriam nesse ponto crucial: o pai morreu, o jovem está só, desorientado, surge o velho sábio e lhe indica o caminho. Se o pai não morrer (ou se sua influência não for mitigada ou reelaborada na vida do jovem), o velho ancião não terá o que fazer, não baterá com o seu cajado na soleira da casa do jovem. O mentor representa uma nova fase na vida do jovem aspirante a herói, mas não como um novo pai, e sim, definitivamente, como O Velho Sábio, exercendo função absolutamente própria e inalienável. Como exemplos contemporâneos do velho sábio na cultura pop, podem-se listar: Mentor, do He-Man; Mestre dos Magos, de Caverna do Dragão; Edin, do Jaspion; Jaga, dos Thundercats; tio Ben, do Homem-Aranha; Obi Wan Kenobi, de Star Wars; Gandalf, d’O Senhor dos Anéis; o professor Xavier, dos X-Men; e Dumbledore, de Harry Potter. A ajuda do velho sábio é uma condição essencial para que o herói se forme. O mentor é quem dá ao herói a arma necessária para enfrentar os perigos de sua jornada. Muitas vezes, essa arma é uma herança paterna, como o sabre de luz que Obi Wan entrega a Luke Skywalker, ou a capa de invisibilidade que Dumbledore entrega a Harry Potter, ou o Um Anel que Gandalf passa a Frodo Bolseiro, o que mostra como o ancião não se identifica com o pai. Ora, é somente o mentor que pode transmitir ao herói - fazer ele enxergar - o poder que seu pai lhe deixou: “esse poder está nas suas mãos agora, cabe a você levá-lo adiante e saber usá-lo com prudência em sua busca pelo tesouro”. O próprio pai não poderia entregar a arma ao herói, pois este último não a aceitaria, ou não a enxergaria, ou não encontraria nenhum uso para ela. É o mentor que finalmente lhe revela, ao lhe entregar as armas, que “o seu pai se foi, você agora está só”. O ancião procura dar as instruções que mostram ao jovem o caminho que ele deverá trilhar para encontrar suas próprias forças e quais os perigos que lhe aguardam em sua jornada em busca do tesouro, mas, diferente do pai, ele não diz: “eu quero que você siga por aqui assim como eu faço”, o que ele diz é: “está vendo aquela senda?, ela é escura e tenebrosa, monstros estão à espreita em cada sombra, mas o que você quer está no fim dela, caminharei um pouco ao seu lado, mas depois você seguirá sozinho”; o pai diz: “é assim que você deve caminhar”, o ancião, por sua vez, diz: “a força do seu jeito de caminhar é esta, aprenda a usá-la corretamente”. Nas narrativas do mito do herói, a figura do pai é retratada, geralmente, como sendo mais possessiva, extremante autoritária, que teme mais pela segurança do jovem, pois não consegue enxergar a força que este possui, não consegue entender como a força do jovem se manifesta de maneira diferente da sua. Já o ancião consegue ver as especificidades da força do jovem, ele sabe quais são suas potencialidades e fraquezas, e mostra a ele como se tornar um herói, elevando suas forças pelo uso mais correto das mesmas. Não obstante, assim como o pai, o mentor também deve morrer (ou ter sua influência mitigada), e em um período bem mais curto do que o pai (pois a adolescência é mais curta, e precisa ser mais curta, do que a infância). O ancião geralmente enfrenta a primeira batalha pelo herói, e é geralmente aí que ele morre, como acontece com Obi Wan Kenobi em Star Wars ao enfrentar Darth Vader na Estrela da Morte. Assim como no caso da figura do pai, essa "morte" do ancião pode ser simbólica, ele pode simplesmente abandonar o herói e cuidar de seus próprios afazeres, como Gandalf em O Hobbit, ou cair na escuridão, como o próprio Gandalf após enfrentar o Balrog em Moria em O Senhor dos Anéis, mas ele nunca poderá seguir com o herói até o final do caminho, apesar de poder voltar a encontrá-lo no final da jornada, quando o jovem já se tornou definitivamente um herói. Sem a ajuda do velho sábio, o jovem não poderá se tornar um herói, mas, para isso, é necessário que o jovem não veja o mentor como um pai substituto ou que pelo menos em um dado momento ele obtenha essa compreensão, por outro lado, é extremamente necessário que o próprio mentor não se veja como um pai substituto, que nunca enxergue o herói como um “filho”, se isso ocorrer, ele não será um mentor, será tão-somente um pai substituto, e o jovem nunca virá a se tornar um herói.

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